sábado, 31 de maio de 2008

Alemanha multifacetada em Sarau Itinerante

Perfil

por Luiza Martin


O público se espremia na sala Luiz Henrique Schuanke do Museu da Arte de Joinville durante o 3º Sarau Itinerante de 2008. A maioria era estudante do Caic Desembargador Professor Francisco José de Oliveira. No mesmo dia (27/05), a mulher de 70 anos, dos olhos e tallier azuis e do cabelo vermelho divulgou o novo sistema de luz responsável pelo tom amarelado da noite dentro da sala do Sarau. O nome dela é Marina Heloisa Medeiros Mosimann. Marina dirige o museu e em todas as apresentações, principalmente na do coral da ACE (Associação Catarinense de Ensino), foi entusiástica nos aplausos. Antes de ocupar a direção do museu, vendia obras de arte.

No ambiente, havia o chão de madeira escura, as pinturas pregadas na parede, 50 cadeiras ocupadas pelo público e as quatro bandeiras: brasileira, alemã, catarinense e joinvilense. Os participantes se limitaram à cultura germânica manifestada na arte, nas brincadeiras tradicionais e na história dos alemães em Joinville. Ilca Behnke, descendente de alemães que divulga os hábitos germânicos pelo país, disse um pouco atrapalhada ao traduzir, que “o alemão jamais deve esquecer sua origem, mas a pátria brasileira também não pode ser desprezada”. Ilca, aos 76 anos relatou uma viagem de Belém a Manaus feita de barco. Ela percorreu todo o trajeto vestida de alemã, para propagar sua cultura.


A anfitriã
Alcione Pauli, 31 anos, se inspirou em Tom Jobim ao batizar a filha: Luiza. Casada com o professor Alencar Schueroff – muito lembrado pelo uso da música nas aulas de literatura –, se formou em letras e faz mestrado sobre Patrimônio Cultural e Sociedade. A tiara vermelha que ela usava no cabelo castanho combinava com a cor das unhas e completava o traje típico germânico. A despeito da indumentária, Alcione se considerou incluída no perfil da “mulher contemporânea, que gosta de viver essa contemporaneidade ao máximo na arte, na cultura e na família”.

Mozart para ouvir Goethe
Luzes apagadas, duas lanternas de emergência, um bastão de madeira, Wolfgang Amadeus Mozart a tocar e Johann Wolfgan von Goethe interpretado por Allan Marllon Viana foi a soma necessária para deixar o público boquiaberto. O ambiente sombrio sugeria a última ânsia do alemão, Goethe: “Abram a janela do quarto, para que entre mais luz”.

Allan desafiou a linguagem verbal – precisou de apenas um dia para aprender o alemão e aplicá-lo em frases intercaladas com outras em português, enquanto andava da esquerda para a direita na sala do museu. Tamanho esforço lhe rendeu uma bolsa de estudos, para aprender o idioma, concedida e anunciada durante o Sarau. O ritmo dos passos dele foi marcado pela combinação entre a música e sua voz. A primeira palavra que pronunciou encerrou a primeira fase da apresentação, a “da gastrite extra-emocional”. Pois, a genialidade que se esconde atrás dos óculos arredondados teme se revelar – sofre de timidez.

O jovem de 20 anos que tem como segunda casa a biblioteca municipal de Joinville, de tanto que lê, estuda e atua não tem tempo para comer. É magro. As calças caem. Por isso adora sua coleção de suspensórios (e porque só lhe servem os cintos infantis). Allan tem a mente inquieta de um gênio habitando a estrutura franzina de um nordestino, que mora em Joinville. Admira a performance do ator Matheus Nachtergaele e os autos do dramaturgo Ariano Suassuna. Já trabalhou no teatro drama e regionalista nordestinos. Sua relação com a arte dramática transita pela contação de histórias, pela poesia escrita por ele próprio, pela interpretação e pelo estudo do teatro.

“Sarau é a maneira mais plena de expor seu íntimo. É falar de amor e plenitude”, divagou Allan. Ele tanto aprecia essa confraternização a favor da arte, que se apresenta em todos os eventos realizados pela Biblioteca Municipal de Joinville.


Brincadeiras e estripulias

Seis crianças do grupo folclórico Windmühle, pertencente à Sociedade Cultural Lírica, mostraram as brincadeiras típicas dos alemães de Joinville. Não se aquietaram em nenhum momento. O pai de duas delas, Odinei Petri, confessou que Josiane, seis anos de idade, e Carlos Eduardo, de apenas quatro anos, não cessam as brincadeiras. Odinei é operador de produção e contou que o filho menor diverte a todos com as trapalhadas – “na Festilha (Festa das Tradições da Ilha de São Francisco), ele escorregou no tablado de madeira e fez todos os colegas caírem”, recordou rindo.

Josi e Dudu, como são chamados pelo pai, formam o casal mais novo do grupo. Para ela a melhor dança é a do “ursinho”, semelhante a sua rotina. Isso porque narra a história de crianças que brincam, festejam e riem até o momento do sono, metaforicamente lembrado como a hora do ursinho.


Uma tríade muit
o entrosada
Maestro, pianista e cantores formam o coral da ACE, que entoou seis melodias no Sarau Itinerante. Dentre elas estava a Marcha Turca de Mozart. A voz do coral foi formada por 29 estudantes. Um deles, Jeferson Jones Bernardes Filho, que tem 20 anos, é estagiário em um escritório de advocacia. Além de estudar Direito na ACE à noite e trabalhar de dia, o futuro advogado joga handebol segunda e quarta-feira das 20horas à meia noite. Na segunda e quinta-feira após às 18h, ele se dedica ao coral durante uma hora. Cantar para Jeferson é lazer.

Mas para o maestro, Luiz Fernando Melara, e para a pianista, Marisa Toledo, música é profissão. Depois da regência vigorosa, o rosto de Melara brilhava de suor. Ele se formou regente na Escola de Música e Belas Artes do Paraná e se aposentou como professor de música pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) em 2005, quando retornou para Joinville. Dirige a orquestra da ACE e já havia participado do coral da Univille (Universidade da Região de Joinville), da qual cobrou indenização pelo uso indevido de seu trabalho após sua demissão em 1999.

Com o som do piano eletrônico, Marisa acompanhava os cantores. Quando ela tinha “mais ou menos dez anos” de idade e três de aulas de piano clássico, ganhou seu primeiro órgão. A pianista é formada pelo Conservatório de Música Erudita e fez pós-graduação em música brasileira. Grávida do primeiro bebê aos 35 anos, Marisa leciona na casa da cultura e demonstrou ser muito tranqüila e consciente da profissão que escolheu. “Trabalhar com música, profissionalmente, não é fácil para ninguém. Só seria se tocassem na banda da Madonna”, comentou ironizando os que almejam a ascendência econômica repentina.


fotos: Luiza Martin

Nenhum comentário: